sábado, 22 de maio de 2010

FALTAM MÉDICOS E NÃO "OS MÉDICOS FALTAM"

Jornal do CREMERJ • MARÇO/ABRIL 2010
ÉTICA MÉDICA: NOVO CÓDIGO JÁ EM VIGOR
EDITORIAL
Faltam médicos e não “os médicos faltam”
            O novo Código de Ética Médica entrou em vigor no dia 13 de abril e teve grande repercussão na imprensa. Infelizmente, o enfoque dado às atualizações foi equivocado. Em vez de valorizar a preocupação dos médicos em modernizar suas regras, contemplando os avanços da medicina nos últimos anos, a Imprensa preferiu ater suas pautas a pequenos detalhes já existentes e apresentá-los de forma negativa, denegrindo a imagem do médico.
            Uma emissora de televisão, por exemplo, em programa de grande audiência, mostrou cenas de hospitais públicos sem médicos para ressaltar o artigo 9º do Capítulo III do Código: “deixar de comparecer a plantão em horário pré-estabelecido ou abandoná-lo sem a presença de substituto, salvo por justo impedimento”. Não ficou claro para o público, entretanto, se os médicos citados faltaram ao plantão ou se há carência de médicos naquelas equipes de atendimento. Também não foram mencionados, em nenhum momento, os principais fatores que provocam a falta de médicos nos hospitais: o salário aviltante que o médico recebe em troca da responsabilidade de salvar vidas e as precárias condições de trabalho, motivos pelos quais a maioria não se fixa na rede pública. Prova disso é que os concursos não conseguem preencher o número de vagas oferecido e os poucos que aceitam o trabalho logo desistem e pedem demissão.
            Acertadamente, o novo Código de Ética aponta, no artigo IV do Capítulo II (Direito dos Médicos), como direito do médico se recusar a exercer suas atividades em locais onde as condições de trabalho não sejam dignas ou possam prejudicar a saúde dos médicos ou a dos pacientes. E ainda, quanto ao atendimento nos hospitais públicos, que a falta de médicos é de responsabilidade do poder público: “na ausência de médico substituto, a direção técnica do estabelecimento de saúde deve providenciar a substituição” (parágrafo único do artigo 9º do Capítulo III – Responsabilidade Profissional).
            Outra crítica veiculada na imprensa diz respeito ao preenchimento de receitas com letra ilegível, generalizando o fato para exemplificar o artigo XI do Capítulo III do Código, como uma grande novidade.
            Essa questão do preenchimento de receitas já constava no Código anterior. Não é nenhuma novidade. E muitos médicos, inclusive, já preenchem suas receitas no computador
            Consideramos que a atualização do Código de Ética Médica era absolutamente necessária, já que a nossa realidade, seja no campo social ou científico, mudou radicalmente nos últimos 20 anos. Ele traz novidades importantes, como o reforço à autonomia do paciente e regras para a reprodução assistida e a manipulação genética. Também prevê seu alcance aos médicos em cargos de gestão, pesquisa e ensino, além de reforçar o caráter antiético da distanásia, observando que “nas situações clínicas irreversíveis e terminais, o médico evitará a realização de procedimentos diagnósticos e terapêuticos desnecessários e propiciará aos pacientes sob sua atenção todos os cuidados paliativos apropriados”.
            É importante ressaltar que o Código de Ética Médica existe para proteger os médicos daqueles que não nos respeitam, mas também, e, principalmente, os nossos pacientes. Ele é a nossa defesa e as dificuldades da administração não podem ser colocadas na conta dos médicos. Ao contrário do que mostravam algumas matérias, o Código de Ética Médica não foi atualizado para tentar conter um suposto desprestígio da classe médica perante a população. A verdade é que o médico é um dos profissionais que gozam de mais credibilidade junto à população, justamente por seu comprometimento com a ética e com o paciente, que fica mais evidente com a modernização do nosso Código de Ética.

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